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“Essa lembrança que nos vem às vezes... Folha súbita que tomba abrindo na memória a flor silenciosa de mil e uma pétalas concêntricas... Essa lembrança... Mas de onde? De quem? Essa lembrança talvez nem seja nossa, mas de alguém que, pensando em nós, só possa mandar um eco do seu pensamento”. A combinação das palavras de Mário Quintana com a sensibilidade de Cesar Ornellas ao lê-las fez da inauguração de “Relicários: História, Memória e Vida” um evento ainda mais especial do que o previsto.  A lembrança resgata pelo escritor une Isabela, Rodrigo, Marcela, Fernando, Claudia, Raisa, Bruno, Alan, Anna Beatriz, Robson, Thiago, Tania, Julia, Elaine, Ana Carolina e Silvana, alunos do curso de História. Todos foram convidados a descobrir o sagrado a partir de suas vivências em mostra que ganhou a Galeria La Salle na última terça-feira, dia 29 de novembro.

Dois meses antes, em outubro, os discentes confeccionavam logo ao lado, na Varanda Cultural, os relicários agora expostos. A proposta da professora Angelina Accetta na disciplina “Ser humano e fenômeno religioso” era fazer os alunos do 4º período criarem caixas ou compartimentos onde pudessem guardar algo simbólico em suas trajetórias. Historiadores contando suas próprias histórias em narrativas compartilhadas, levando a um entendimento prático dos conceitos trabalhados em sala. No evento “Arte e História ao ar livre” eles trocaram memórias entre si, mas o resultado deu tão certo, que a docente e também coordenadora da Galeria, decidiu transformar os produtos em obras dignas de serem contempladas pelo público.

“Relicários são altares, formados pelos objetos que evocam aqueles que amamos. Pois, numa palavra, a dimensão maior do sagrado é o amor incondicional. Cada objeto no interior dos relicários construídos por vocês, revela a lembrança de uma pessoa querida, de um tempo que passou, de uma experiência vivida. Tais relíquias evocam situações e percepções, significados únicos, pessoais, guardadas no relicário de nossos corações”, poetizou Ornellas, professor do curso, após a leitura de Mário Quintana. A descrição casa perfeitamente com o baú de preciosidades da aluna Marcela Possollo.

Os significados começam para ela já no revestimento externo de sua caixa, com a estampa de livros remetendo à vida universitária e à escolha pela História. Toda a parte interna, por sua vez, é coberta por um tecido de chita, que representa o “Nordeste que existe em mim. Meu saudoso pai baiano”. No alto, uma pomba iluminada parece abençoar os retratos da família, com referências ao “Deus como centro da minha vida” e “o sentimento do sagrado de tudo que eu tenho, meu casamento de 25 anos, minhas filhas, e meus netos Jorge Henrique e Rafael Luiz”.  

A família motivou muitos objetos, mas Julia Vilella Freitas optou pela música. “Meus ingressos representam o sagrado por terem me levado a ver quem escreveu e me emocionou com suas letras”, explicou na inauguração, “A trilha sonora da minha vida foi composta pelos artistas que vi e escutei ‘ao vivo’. Ouvir música me leva a outra realidade, em um mundo paralelo onde tudo passa e não há medo”. Para complementar o depoimento, ela ainda trouxe os versos do poeta Henry Wadsworth Longfellow (1807-1882). O estadunidense aconselhava no século XIX: “Mostre-me um lar em que habite a música e mostrar-lhe-ei um lar feliz, tranquilo e alegre”.

Thiago de Oliveira Pereira trouxe para a mostra a definição original da palavra relicário – do latim relicarium, “lugar dos restos” –, o construído socialmente – “traduz sentimentos e emoções sacralizadas de um indivíduo” – e o sentido para si. “Fui buscar aquilo que há de mais importante para mim, muito mais do que simplesmente uma tradição ou um viés religioso. Os ícones de Jesus Cristo, me ajudam a elevar a Deus minhas preces e meus anseios, angustia e dores, alegrias e esperanças. O terço mariano, me faz, através de uma devoção, acalmar o interior. As reflexões da vida de Jesus sob a ótica mariana me levam a momentos contemplativos num mundo tão corrido e barulhento”, explicou elencando suas relíquias.

Angelina Accetta, coordenadora da Galeria, encerrou a noite de estreia da exposição ressaltando que perceber a relação do homem contemporâneo com o sagrado é desenvolver tolerâncias e o respeito por cada crença:

“O homem concebe o divino como algo que transcende a vida normal. Ele é um ser cultural e esta premissa o faz buscar sentido para o universo de coisas que o rodeia. Enquanto constrói os significados, vai adquirindo hábitos que são culturais e religiosos. Se o ser humano e o mundo são culturais, esta compreensão do sagrado acaba sendo também”.

As lembranças que nos vem às vezes de “Relicários: História, Memória e Vida” seguem em cartaz até o dia 9 de dezembro. Visitações gratuitas de segunda a sexta-feira, das 9h às 21h.

 

Os historiadores

 

 

 

Alguns dos relicários

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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